Casa Carmar

Memorial Descritivo:

Residência à beira-mar/ Cumbuco-CE

O projeto de uma casa à beira-mar é sempre um grande desafio e uma grande oportunidade. As premissas básicas desse projeto são de ordem dimensional-quantitativa e um programa de atividades específico elaborado em parte pelo cliente sob a orientação e revisão do arquiteto. A premissa básica é de ordem topológica, dada pelo entorno e pelas condições climáticas e locacionais específicas do terreno. O condicionamento ambiental e observância à correta implantação da residência foram a maior preocupação para o início da definição do partido arquitetônico. Ventilação, iluminação, condicionamento ambiental de ambientes de permanência prolongada, proteção à insolação excessiva, proteção contra os ventos excessivos em três meses do ano. Possibilidade de regular ventilação e configuração interna, comunicabilidade e integração entre ambientes de estar internos e área externa de varandas e paisagismo, lazer piscina. Respeito à nossa cultura construtiva e à tradição de sobriedade luso-brasileira.

Em uma metodologia inédita e questionável, o arquiteto deu aos clientes a possibilidade de escolher entre três opções distintas de estudos preliminares. Opções que seguiram conceitos norteadores básicos idênticos. A ausência prolongada dos clientes, a diferença cultural, a exigüidade de reuniões de elaboração iniciais e discussão de estudos, esboços, croquis, planos de massa e maquetes de estudo; tornou imprecisa a definição de um partido arquitetônico que atendesse às expectativas dos clientes; daí o profissional optou por essa laboriosa metodologia.

A orientação da casa segue a obviedade de nossa latitude semi-equatoriana. Quartos e ambientes de permanência prolongada voltados para o início do passeio do carro de Apolo. A implantação segue o princípio básico de um “L”, separando as suítes de convidados da Suíte principal; com a área de estar na intersecção dessas duas asas distintas. Todos os banheiros foram dimensionados para ter acessibilidade plena. O Salão de estar e jantar comunica-se com a varanda externa principal por portas pantográficas trazendo a brisa marinha e a visão do oceano para o interior da casa e criando a subjetividade e incerteza espacial interior-exterior. Os quartos foram estudados para proporcionar a seus usuários conforto ambiental, brisa, espaços arejados e iluminados, frutos de uma arquitetura com beirais generosos, aberturas estudadas e seguindo princípios de exaustão e ventilação cruzada. A varanda principal é definida por um pórtico que emoldura visuais desimpedidas; o espaço é resguardado por uma extensão de caramanchão em balanço de madeira, filtrando as primeiras luzes da alvorada e proporcionando a permanência confortável em desjejuns e em contemplações vespertinas.

O Salão com pé-direito duplo funciona como elemento espacial de ligação, ao mesmo tempo, separação entre área das suítes e ala da suíte principal. É o pulmão da casa, recebe a brisa marinha, joga-a para o alto pela esquadria elevada do segundo pavimento e pelo rasgo longitudinal que ilumina e faz a casa respirar.  Recebe a iluminação nascente, inunda a casa com luz indireta do zênite, há ainda o brilho difuso do vitral poente e a Caixa de escada que se abre parcialmente ao sol. Multiplicidade de pontos focais luminosos.

A configuração de implantação da casa, dos cômodos, permitiu uma solução volumétrica interessante. Com varandas dos quartos independentes do volume principal da casa. Cobertas independentes e estrutura em madeira, conferindo ao conjunto uma pertinente e cabível identidade visual compatível com uma residência de praia; que acabou por se mostrar como aprazível ao gosto dos clientes. Buscamos uma estética orgânica, com riqueza de volumes, espacialidades, texturas e materiais. A coberta central do salão, independente dos níveis desencontrados da coberta da casa, proporcionando solução de iluminação zenital, colocação de aparelhos condensadores de unidades split, colocação de painéis fotovoltaicos, longe da vista do observador. Outro aspecto técnico digno de nota é o aproveitamento de águas servidas em cisterna para seu re-uso em jardinagem e outros. Minucioso estudo de insolação e destino de águas pluviais, evitando-se ao máximo calhas acima de ambientes de maior relevância e quedas de água de chuva danificando por pressão hídrica intermitente, paredes, pisos e terraços. Acima da varanda principal térrea foi criado também um solário, belvedere de permanência e mirante do oceano. Os guarda-corpos em madeira e vidro seguem geometricidades específicas e desenho exclusivos para essa casa. Com o desenvolvimento, amadurecimento e detalhamento do projeto, pretendemos a surpresa e o enlevo que detalhes bem desenhados e pensados certamente proporcionam.

Além da residência principal foi projetada uma habitação para o caseiro e sua família, seguindo também, evidentemente, pressupostos de orientação e de condicionamento ambiental. Temos também garagem para veículos e quadriciclo. Piscina com área de lazer e coberta de palha para assentos com hidromassagem e piscina infantil, cadeiras molhadas. Há ainda o espaço para deck, churrasqueira e depósito para guarda de mobiliário externo, apetrechos de piscina, material esportivo náutico, kite-surfs e miscelânea. Na extremidade norte- poente do terreno criamos um espaço ímpar de estar e apreciação da paisagem praiana. Mirante de madeira; ideal para crepúsculos e drinques ao ocaso e ao acaso. O terreno abre-se ao mar; transparente através de um muro que intercala pedra e vidro.

Um bom projeto é fruto direto de um bom cliente, é sempre uma bem-sucedida co-produção, simplificando, sintetizando muito o processo técnico-criativo. Um bom diálogo e entendimento entre as partes, embates dialéticos, entre gosto, síntese, antítese, análise, solução. Acreditamos que esse projeto está bem encaminhado, não finalizado, porém acenando para possibilidades promissoras de uma bem sucedida solução final técnico-artística. Ainda estamos, para usar o vernáculo dos clientes, na fase de “work-in-progress”; embora o partido arquitetônico esteja definido, projeto de aprovação em desenvolvimento; ainda há muito a se fazer. Aristóteles definiu a virtude como sendo o meio termo entre dois extremos, um ponto de equilíbrio, por exemplo, a coragem entre a covardia e a temeridade, a amizade entre o desdém e a condescendência.  A busca é incessante pelo meio termo arquitetônico Aristotélico da virtude, entre a busca explícita, não velada, pelo belo, pelo aprazível aos olhos, pela solução quase exuberante, que enleve o expectador/observador/usuário; em contrapartida às soluções técnicas, racionais e de coerência arquitetônica. O meio termo é uma busca, uma meta, nunca sabemos se alcançamos tal fim.

 

Arqto. Rogério Braga – Maio de 2014.

Informações da Obra
  • Cliente
    Carmar Emp. Imob
  • Período
    2014/2015
  • Autor
    B2 Arquitetura